Produtores citam dificuldades, frigoríficos culpam supermercados, que respondem por sua vez que margem de redução foi muito pequena
A suspensão das exportações da carne bovina brasileira para a China tem levado especialistas a prever que o preço do produto caia nos supermercados, mas a queda ainda não tem sido observada pelos consumidores. A Associação dos Criadores de Mato Grosso (Acrimat) aponta que não participa do preço final do produto e afirma que está tendo prejuízos no cenário atual. Já os frigoríficos culpam os supermercados por não promover a redução, enquanto os supermercados apontam que receberam uma margem muito pequena dos frigoríficos para diminuir os valores nas gôndolas.
A exportação da carne bovina brasileira foi suspensa voluntariamente pelo ministério da Agricultura, em 4 de setembro, depois que foram notificados dois casos da doença Encefalopatia Espongiforme Bovina, mais conhecida como “vaca louca”. Inclusive, uma delas foi em Mato Grosso. A suspensão já dura quase dois meses e já poderia ter sido derrubada, mas a China não retomou as compras por problemas econômicos internos.
Segundo o Instituto Mato-grossense da Carne, os prejuízos da suspensão da compra de carne bovina pela China ultrapassam mais de 60 milhões dólares apenas para Mato Grosso. Na conversão para a moeda brasileira o rombo chega a mais de R$ 338,3 milhões, conforme cotação do real a R$ 5,64 de sexta (22). Até o fim de outubro, o impacto pode chegar 88,17 milhões de dólares, o que daria mais de R$ 451,1 mil.
O diretor de operações do Imac, Bruno de Jesus Andrade, explica que os números já refletem o efeito China. “No Brasil, até o momento a perda diária foi de 10,4 milhões de dólares por dia útil e 42% desta receita seria de Mato Grosso. A suspensão está trazendo prejuízos não só para a indústria, no campo a arroba do boi já caiu cerca de 20% nas últimas semanas”, aponta.
Com a suspensão, a expectativa é que a carne seja destinada para o mercado interno, ou seja, para os próprios brasileiros. O movimento pode fazer com que o preço da carne diminua nos supermercados, contudo, ela ainda não está sendo sentida pela população. O diretor do Imac aponta que “pode levar mais tempo para que a desvalorização no campo e no atacado possa ser verificado nas gôndolas dos supermercados”.
O diretor técnico da Associação dos Criadores de Mato Grosso (Acrimat), Francisco Manzi, aponta que o trabalho dos produtores é de dentro da porteira e explica que a venda do boi é definida pelos frigoríficos. “Não participamos da formação do preço final ao consumidor”, diz.
Francisco pontua que o produtor de gado está passando por uma situação muito difícil, apesar do preço da arroba do boi ter subido e as exportações aumentado, ambos cotados em dólar valorizado, antes da suspensão da China. “Os nossos custos subiram, proporcionalmente, até mais que o preço de venda. O produtor está em uma corda bamba, fechando praticamente no vermelho”.
Entre os custos, está a alimentação do gado, que tem como cardápio algumas commodities como soja, milho e algodão, que são influenciáveis pela alta do dólar. A crise hídrica também pesou, já que acabou com a pastagem dos bois e prejudicou a colheita de agricultores. Ele acredita que esse custo deve permanecer por algum tempo.
Nesse cenário, Francisco conta que a situação varia de produtor para produtor. Os que não podem segurar o gado vendem por um preço abaixo do mercado, tem uns que conseguiram travar o preço e conseguiu minimizar os impactos, e outros que podem segurar e esperar um cenário de venda favorável. “Mas, em média, a atividade está com uma margem muita apertada [de ganho], praticamente nula”.
Francisco aponta que a arroba do boi estava sendo vendido por volta de R$ 310 há dois meses. Hoje, o preço já gira em torno de R$ 270.
Preço não chegou no consumidor
O Sindicato das Indústrias de Frigoríficos (Sindifrigo) culpou os supermercados por não proporcionar a queda do preço da carne. “Houve quedas de 15% a 20% na arroba do boi e na carne da indústria para o atacado, mas no balcão não teve nenhuma queda, ou seja, foi 0% o que o varejo baixou em seus produtos. Distorção que mostra a ganância de um elo que não quer fazer parte de uma corrente da cadeia”, diz em nota assinada pelo presidente Paulo Bellincanta e publicada na semana passada.
O Sindifrigo conclama que “está na hora de o balcão mostrar sua parceria, baixando os preços do produto e proporcionando maior vazão a nossa produção”. Afirma também que todos se ajudem. “Os balcões dos açougues e supermercados precisam se engajar na cadeia e não se apresentarem como inimigos”, disse no final.